10 de Junho, Dia de Portugal
Sessão de Poesia de Homenagem a Camões
A SHIP e o Guião – Centro de Estudos Portugueses organizaram conjuntamente uma sessão de poesia, de homenagem a Camões, no dia 10 de Junho do corrente ano, complementando as habituais comemorações do Dia de Portugal, em Lisboa, que incluíram a Santa Missa, no Mosteiro dos Jerónimos, rezada por intenção de Portugal e de sufrágio pelos que tombaram pela Pátria, e a Homenagem aos Combatentes junto do respectivo monumento.
Na sessão de poesia, que decorreu junto ao túmulo de Camões, foram apresentados três poemas de associados da SHIP (Dr. Eugénio Ribeiro Rosa, presidente do Conselho Supremo, Eugénio Roque, membro do Conselho Fiscal, e Coronel Roberto Ferreira Durão), além da declamação, pela nossa consócia Dr.a Elvira Correia, de dois poemas, alusivos ao tema (“Camões” in Poemas Ibéricos e “Lápide” no Diário XIII), de Miguel Torga, e pelo consócio Dr. João Abel da Fonseca, das “Palavras do Condestável” in Os Lusíadas, Canto IV. A sessão terminou com a leitura, pelo presidente da Direcção Central, Dr. Jorge Rangel, de um poema do saudoso poeta macaense José dos Santos Ferreira, em crioulo português de Macau (patuá), intitulado “Camões – Grándi na Naçám”, que suscitou grande curiosidade.
O sucesso desta sessão recomenda a realização de idênticas iniciativas no futuro.
Camões
Não morreste com a Pátria, és imortal
E a Pátria renasceu da tua voz,
Da força que tu deste a Portugal
Da força que tu dás a todos nós.
Como tu, enfrentamos hoje o perigo
De perder o que temos mais sagrado.
Por isso estamos hoje aqui contigo.
Precisamos de ti ao nosso lado!
Precisamos do amor e da coragem,
Da lucidez, da força, da vontade
Com que chegaste exausto à outra margem
Salvando o hino à lusitanidade.
Chegou a nossa vez de entrar na arena
Onde a vida vale tudo ou não vale nada.
Inspira-nos, Camões, com a tua pena,
Empresta-nos, Luis Vaz, a tua espada.
Poesia da autoria de Eugénio Roque
Declamada pelo autor
(sócio n.° 2802)
Camões in Poemas Ibéricos, Os Heróis
Nem tenho versos, cedro desmedido
Da pequena floresta portuguesa!
Nem tenho versos, de tão comovido
Que fico a olhar de longe tal grandeza.
Quem te póde cantar, depois do Canto
Que deste à pátria, que to não merece?
O sol da inspiração que acendo e que levanto
Chega aos teus pés e como que arrefece.
Chamar-te génio é justo, mas é pouco.
Chamar-te herói, é dar-te um só poder.
Poeta dum Império que era louco,
Foste louco a cantar e louco a combater.
Sirva, pois, de poema este respeito
Que te devo e professo,
Única nau de sonho insatisfeito
Que não teve regresso.
Poesia da autoria de Miguel Torga
Declamada por Elvira Escarduça Correia
(sócio n.° 4807)
Camões
Nesta data celebrada,
Neste local, que é memória,
Estamos aqui reunidos
Ao chamamento da História.
Nesta data celebrada
Foi Camões que aqui nos trouxe,
Um Camões de capa e espada,
Fosse lá ele quem fosse.
Nesta data celebrada
Um Camões de capa e espada,
Torna a memória activada
Por vivências variadas…
Ao longo das nossas vidas
Das de cada um de nós,
Temos presenças sentidas
Muitas vezes, sem maldade,
O Camões foi pesadelo,
Bem lembrado,
No dividir de orações
Do poema celebrado.
Mas eu digo, quem o leu,
Foi graça que Deus lhe deu,
Está liberto do pensado!…
Tanto dele nos falou,
Das terras onde viveu,
Dos muitos amores que amou…
De Constância, da inconstância.
Deu nome a um largo em Lisboa
E em muitos sítios mais.
Recordo o Pátio do Tronco,
Onde esteve aprisionado
E Coimbra onde estudou
E brigou de capa e espada.
No sabor do saber apaixonado,
Nos clássicos se mostrou aprimorado.
São os largos percursos percorridos.
Os vigorosos anos que ditaram,
Para a memória, os versos que ficaram…
Ao acaso recordo a “linda Inês”.
Na vida, tanta vez,
O Cabo das Tormentas,
Melhor, da Boa Esperança.
Quem espera sempre alcançai…
E os “Doze de Inglaterra”?
Só de neles pensar
Recordo o Amor, que tão bem soube cantar…
Natércia e a Infanta, Violante, também?
Mitos? Verdades? Quem o póde saber?
Mas sempre, e, em grande plano, o Mar!
Camões estará presente ao nosso lado.
Foi Ceuta a combater.
Olho vazado. Foi à índia e Macau
Da sua Dinamene…
Moçambique, na Ilha, em pores do sol a arder…
Rico sim, só no sentir,
No demais, arruinado!
Fora um pobre Poeta naufragado,
Que na foz do rio Mekong,
Póde salvar a memória
Do velho Portugal!
Nesta data celebrada,
Neste local, que é memória,
Mergulhámos em Camões,
Num pouco da sua história…
Foi, no fundo, um Português
Vivendo glórias e perigos.
Hoje podemos chamar-lhe
Um Português dos antigos!
Nos defeitos, nas virtudes,
Nos saberes, na doação,
Num “finis patriae” vivido,
Projectado no Futuro.
Querendo saber-lhe a Lição,
Agora vivemos todos,
Que aqui estão reunidos,
No temor de um “finis patriae”
Mas com Ele, nesta hora
Já não nos sentimos sós.
Seja esta Hora a da Esperança
E seja nossa a vitória,
Vitória de todos nós!
Poesia da autoria de Eugénio Ribeiro Rosa
Declamada pelo autor
(sócio n.° 2642)
Lápide in Diário XIII
Luis Vaz de Camões.
Poeta infortunado e tutelar.
Fez o milagre de ressuscitar
A Pátria em que nasceu.
Quando, vidente, a viu
A caminho da negra sepultura,
Num poema de amor e de aventura
Deu-lhe a vida,
Perdida.
E agora,
Nesta segunda hora
De vil tristeza,
Imortal,
É ele ainda a única certeza
De Portugal.
Poesia da autoria de Miguel Torga
Declamada por Elvira Escarduça Correia
(sócia n.° 4807)
Palavras do Condestável in Os Lusíadas, Canto IV
13
Não falta com razões quem desconcerte
Da opinião de todos, na vontade,
Em quem o esforço antigo se converte
Em desusada e má deslealdade;
Podendo o temor mais, gelado, inerte,
Que a própria e natural fidelidade:
Negam o Rei e a Pátria, e, se convém,
Negarão, como Pedro, o Deus que tem.
14
Mas nunca foi que este erro se sentisse
No forte Dom Nuno Álvares; mas antes.
Posto que em seus irmãos tão claro o visse,
Reprovando as vontades inconstantes,
Àquelas duvidosas gentes disse,
Com palavras mais duras que elegantes,
A mão na espada, irado, e não facundo,
Ameaçando a terra, o mar e o mundo.
15
Como?! Da gente ilustre Portuguesa
Há-de haver quem refuse o pátrio Marte?
Como?! Desta província, que princesa
Foi das gentes na guerra em toda a parte,
Há-de sair quem negue ter defesa?
Quem negue a Fé, o amor, o esforço e arte
De Português, e por nenhum respeito
O próprio Reino queira ver sujeito?
16
Como?! Não sois vós inda os descendentes
Daqueles, que debaixo da bandeira
Do grande Henriques, feros e valentes,
Vencestes esta gente tão guerreira?
Quando tantas bandeiras, tantas gentes
Puseram em fugida, de maneira
Que sete ilustres Condes lhe trouxeram
Presos, afora a presa que tiveram?
17
Com quem foram continuo sopeados
Estes, de quem o estais agora vós,
Por Dinis e seu filho, sublimados,
Senão co’ os vossos fortes pais, e avós?
Pois se com seus descuidos, ou pecados,
Fernando em tal fraqueza assim vos pós,
Torne-vos vossas forças o Rei novo:
Se é certo que co’ o Rei se muda o povo.
18
Rei tendes tal, que se o valor tiverdes
Igual ao Rei que agora alevantastes,
Desbaratareis tudo o que quiserdes,
Quanto mais a quem já desbaratastes.
E se com isto enfim vos não moverdes
Do penetrante medo que tomastes.
Atai as mãos a vosso vão receio,
Que, eu só, resistirei ao jugo alheio.
19
Eu só com meus vassalos, e com esta
(E, dizendo isto, arranca meia espada),
Defenderei da força dura e infesta
A terra nunca de outrem subjugada.
Em virtude do Rei, da pátria mesta,
Da lealdade já por vós negada,
Vencerei não só estes adversários
Mas quantos a meu Rei forem contrários.” […]
Poesia da autoria de Luis Vaz de Camões
Declamada por João Abel da Fonseca
(sócio n.° 3962)
“Cantando espalharei por toda a parte se a tanto me ajudar o engenho e arte”
Para ti Camões:
Nosso Mestre, nossa Pátria, nosso Futuro – Passado.
1
Cantaste o teu País, nossa Pátria Imortal
Que foi e será sempre o Mar universal.
Foste como um farol: no Mar não naufragou,
Deus com terra e com sal foi no Mar que a sagrou.
Conseguiste, poeta e soldado, juntar:
Terra!: Quase deixou de florir e sonhar.
Povo!: Que o Mar ungiu de Glória e de Tormento
Contigo ele estará nas ondas e no vento.
Foste guerreiro – poeta: Ousar, sonhar – viver!
Perdeu-se Alma e Distância, dá-nos teu saber
Para acharmos um rumo em nosso caminhar.
Houve algo grande em nós que desprezámos: Ser! …
Tudo isso perdemos, não soubemos ver
Que lavrarmos a terra era cumprir o Mar.
2
Na língua Pátria e Deus se cumpre o meu destino.
Em versos esculpi a voz da Liberdade
De Portugal ergui, nosso universo, um hino
Feito de Raiva, Amor, de Paixão e Verdade.
Despertai-nos Senhor! Lusa Pátria esquecida
Quinto Império perdido em ganância e vã glória,
Na índia, no Brasil, em África traída
Renascerá um dia, pura, em nova História.
Poeta sou e a Deus me dou com humildade,
Sua Luz brotará no seio da cristandade
No sangue que lavrou todo o Mar já sem fim.
Sempre me acompanhou e inspirou Jesus
E se não fui, como Ele, cravado na cruz,
A cruz, Palavra e Luz, vai-se cravando em mim.
Poesia da autoria de Roberto Ferreira Durão
Declamada pelo autor
(sócio n.° 4733)
Camões – Grándi na Naçám
(Poema em patuá, crioulo português de Macau)
Poeta qui onçom capaz cantá
Tudo estória di nôsso Portugal;
Poeta qui isquevê pá mundo olá
Grandeza d’ alma, gente sim igual.
Qui si miséria na vida passá
Atormentado pa sina fatal;
Poeta co talénto levantá
Fama di su quirido Portugal.
Luis di Camões sã nómi isquivido
Co ternura na nosso coraçám
Lembrado co doçura na uvido.
Na vida fuzi di persiguiçám,
Vôs quelora quelé disconhicido,
Agora sã qui Grándi na Naçám!
Camões – Grande na Nação
(Versão livre, em português)
Poeta que sozinho inspirado cantou
Toda a história do nosso Portugal;
Poeta que para o mundo descreveu
A grandeza de alma desta gente sem igual.
Na vida conheceu misérias
Atormentado por uma sina fatal;
Poeta com talento levantou
A fama do seu querido Portugal.
Luis de Camões tem o nome gravado
Com ternura no nosso coração
E é por todos com doçura lembrado.
Na vida vítima foi de perseguição
E quase desconhecido por ela passou;
Agora é, por mérito, o maior da nossa Nação!
Poesia da autoria de José dos Santos Ferreira (Adé)
Declamada por Jorge Rangel
(sócio n.° 2825)