«O nosso plano para os 900 anos de Portugal é simples e longo. Simples para poder ser entendido, longo para poder ser saboreado e assimilado.»

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José Ribeiro e Castro

Que belo dia este! Que belo dia este por que esperámos e trabalhámos três anos: 2023, 2024 e, finalmente… 2025! É hoje. Hoje, é hoje. Faz três anos que aqui viemos pela primeira vez, com a Grã Ordem Afonsina, sempre muito bem acolhidos pelas gentes de Zamora e pelas suas instituições públicas e privadas. Muito, muito obrigado.

O nosso plano para as comemorações dos 900 anos de Portugal é simples e longo. Simples para poder ser entendido, longo para poder ser saboreado e assimilado. Agarramos no facto de, olhando à fundação de Portugal, não haver um dia único em que possamos dizer que foi aí que tudo aconteceu. E, assim, olharmos às datas mais relevantes no seu conjunto e celebrarmo-las todas como um processo. Isto é, transformamos uma aparente fragilidade numa força.

Foi esse processo que nos fez – próprios, livres e independentes – e é esse processo e a sua recordação que são a nossa força. Não há um dia só em que, antes, não fôssemos e, a seguir, como por magia… tã tãaaaaa… já lá estivéssemos. Mas há o processo, sólido e maduro, de uma cadeia de acontecimentos que nos conduz, desde a afirmação de uma vontade à tomada do poder e à afirmação sobre inimigos até ao reconhecimento da sermos próprios e à consagração internacional da independência.

Essas datas principais foram em 1128, 1139, 1143 e 1179. Agora, acrescentámos este primeiro 1125, porque espelha vontade e ambição daquele que viria a ser o nosso primeiro rei, então muito jovem; e porque mostra ousadia, um traço saliente da liderança de Afonso Henriques. E, no final, pensamos dever acrescentar 1185, porque é o ano da morte do nosso rei fundador, porque nesse ano ainda foram atribuídos os últimos forais do seu reinado – forais portugueses que também estão a comemorar 900 anos (neste ano, é Ponte de Lima) – e porque Afonso Henriques merecerá sem dúvida, em 2085, uma grande homenagem nacional no 9.º centenário da sua morte.

É este o processo simples e longo de que falei há pouco. Olhando às primeiras quatro datas, estamos a falar de 50 anos. Juntando ainda as outras duas 1125 e 1185, estamos a falar de 60 anos. Não é estarmos todos os dias em festa, o que obviamente seria um disparate. Mas é termos sempre presente que este ciclo corresponde a um processo fundacional que vamos acompanhando tal como ele foi andando.

A construção é simples, porque parte da realidade e é nela que assenta. Diria até que é uma construção óbvia. Faria algum sentido pensar que Portugal, em 2028, não celebraria os 900 anos da batalha de S. Mamede? Faria algum sentido pensar que Portugal, em 2039, não celebraria 900 anos da batalha de Ourique, tenha-se dela a ideia e o conhecimento que se tiverem? Faria algum sentido pensar que Portugal, em 2043, não celebraria os 900 anos da conferência de Zamora? Faria algum sentido pensar que Portugal, em 2079, não celebraria os 900 anos da bula Manifestis Probatum, por que recebemos do Papa, urbi et orbe, o nosso pleno reconhecimento internacional? A resposta a estas perguntas é sempre a mesma: não, não, não e não! Não faz sentido pensar que não se celebrassem aquelas datas. O que o mesmo é dizer, portanto, que, quanto a cada celebração, a resposta é: sim, sim, sim e sim. É exatamente esse o plano que desenhámos e estamos a montar e a pôr de pé. Celebrar todas essas datas – por Portugal, com Afonso Henriques. Um plano simples, porque assenta na realidade.

Duas outras notas, para concluir o essencial.

A primeira tem a ver com o “longo”, um plano longo. Sinto-me cada vez mais fascinado com um aspecto da cultura chinesa. Os chineses são capazes de pensar a 50 ou 100 anos de distância. São capazes de debater, de negociar e até de escrever nessa perspectiva. O Ocidente não. Quando estudei economia, o curto prazo era 1 ano, o médio prazo 2 a 5 anos e o longo prazo 6 a 10 anos. Ora, historicamente 10 anos é nada. Os desafios estão nos 50 anos ou mais e na visão larga para os antecipar ou projetar. Grande é a cultura que o cultiva e consegue, como a chinesa. Tem ainda outra vantagem: quem olha para longe não se afunila, focado apenas no próprio umbigo; vê longe, para além do horizonte, e caminha com confiança. A capacidade de projetar a essa distância cria oportunidade para mobilizar a comunidade num sentido fortemente prospectivo. Alimenta coesão social pelo propósito comum; e a visão larga gera segurança colectiva e fortalece o sentido de pertença. Nós também precisamos disso. Todos os povos precisam disso.

A história, um dos nossos grandes recursos nacionais


A segunda nota é a minha convicção, enraizada, de que a história é um dos nossos grandes recursos nacionais. 900 anos são um enorme tesouro de Portugal! Uma grande arca do tesouro, que nós só ganhamos em divulgar, em conhecer, em aprofundar. É seguramente assim quanto ao período da fundação – os 50/60 anos que estou a referir – e é também quanto a outros momentos definidores da nossa história, relevantes em eixos fundamentais da nossa existência, que podemos celebrar também dentro da janela temporal de 2025 a 2085.

Este programa é um reforço extraordinário da nossa auto-estima e das nossas raízes. A lembrança inteira de como nos fizemos, dos êxitos que alcançámos, dos erros que cometemos, do que demos aos outros, das relações que construímos, do que temos ainda por fazer.

A história é a reserva da nossa identidade. Fortalece, pelo longuíssimo prazo, o nosso sentido de pertença, a nossa coesão, o nosso carácter. Seremos um melhor país se o fizermos. Seremos uma nação mais sólida se o cultivarmos. Seremos um povo melhor se nos habilitarmos com a experiência registada e construída pela história. Como dizia o poeta, um cantor revolucionário: “Eu vim de longe, De muito longe, O que eu andei pra aqui chegar.” E apontava: “Eu vou pra longe, Pra muito longe, Onde nos vamos encontrar, Com o que temos pra nos dar.”

A oportunidade para nos reencontrarmos


Na Sociedade Histórica da Independência de Portugal, a que presido, acreditamos firmemente que estes 50 ou 60 anos por diante são a extraordinária oportunidade para nos reencontrarmos connosco depois de um ciclo longuíssimo que cobre mais de metade da nossa História, o ciclo das Descobertas, redefinirmos o nosso papel, as nossas aspirações, o nosso sonho colectivo, e tornarmo-nos mais capazes de o realizar, porque alimentados por uma memória que tem muito mais de êxito do que de fracasso, muito mais de energia do que de dormência, muito mais de rumo do que de desnorte.

Digamos que estes próximos 50 ou 60 anos são o último presente que D. Afonso Henriques nos deixou. Legou-nos a possibilidade destes riquíssimos 900 anos que fomos e somos. Cumprimos.

A verdade é que cumprimos e ainda aqui estamos: o reino cristão mais antigo da Península (hoje, República), as fronteiras mais antigas da Europa, um dos países mais antigos do mundo, com uma língua global das mais faladas. Chegou a hora de conhecer, cultivar e festejar.

Parabéns a você!

Viva Zamora! Viva o Reino de Portugal! Viva Portugal!