«D. Dinis revelou larguíssima visão e um notável, raro e apaixonante sentido estratégico.» *

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José Ribeiro e Castro

No ciclo largo dos 900 anos de Portugal que começamos a comemorar neste ano, com a grande cerimónia prevista para Zamora, no próximo dia 8 de Junho, este 7.º Centenário da morte d’El-Rei D. Dinis é o primeiro grande Centenário que cai dentro dessa janela temporal que definimos e que se alarga quase até ao final do século: até 2085, quando passarão 900 anos sobre a morte de D. Afonso Henriques, nosso primeiro rei, fundador.

Intervenção do presidente da Direcção, Dr. José Ribeiro e Castro na Homenagem da Sociedade Histórica, a El-Rei Dom Dinis, no 7.º Centenário de sua morte, no Castelo de São Jorge.

D. Dinis merece bem a coincidência de abrir este primeiro ano do ciclo 2025-2031, ano que dedicamos especialmente ao tema “O Território e o Municipalismo”. Por isso, deixo aqui, em breves palavras, a homenagem da Sociedade Histórica da Independência de Portugal a um dos maiores reis da nossa História.

D. Dinis foi o primeiro rei da 1.ª Dinastia que não teve de preocupar-se com a Reconquista, pois, no nosso espaço da Península, o seu pai (Afonso III) tinha concluído o trabalho, com a conquista do Algarve e com o Tratado que confirmou a nossa posse do Reino dos Algarves. (Castela e Aragão só concluiriam a sua parte dois séculos mais tarde.)

Lançou-se, portanto, a pacificar relações e a organizar o país, no que revelou larguíssima visão e um notável, raro e apaixonante sentido estratégico.

Pacificou as relações com a Igreja Católica, onde o caldo se entornara no reinado de seu pai. A normalização dos laços com a Santa Sé, além de estabilizar a relação com o clero, facilitou por certo um dos principais êxitos de D. Dinis: criar, com apoio papal, uma ordem religiosa e militar muito presente nos séculos seguintes da nossa História, a Ordem de Cristo, para a qual transferiu o património português dos templários, em lugar de tudo desmantelar com a extinção da Ordem do Templo, ordenada por Roma.
A obra de governo de D. Dinis cuida nada mais, nada menos do que de quatro pilares estratégicos de Portugal:

  1. o território
  2. a língua
  3. a identidade
  4. o mar.

E, quanto ao território – um dos mais preciosos recursos estratégicos do país, hoje tão maltratado –, D. Dinis abordou-o coerentemente em diferentes ângulos:

  1. a fronteira,
  2. o povoamento,
  3. a produção,
  4. a organização.


El-Rei D. Dinis acordou, com Leão e Castela, a última fronteira que faltava definir, dividindo territórios da Reconquista, a fronteira oriental de Portugal desde as terras de Riba Côa ao Alentejo, incluindo Olivença – é o famoso Tratado de Alcanizes de 1297.

Punho da espada do rei D. Dinis que se encontra no seu túmulo no Mosteiro de S. Dinis e S. Bernardo de Odivelas
Punho da espada do rei D. Dinis que se encontra no seu túmulo no Mosteiro de S. Dinis e S. Bernardo de Odivelas

Outorgou dezenas de novos forais (um pouco mais de 80) e confirmou outros, num total de mais de uma centena, sobretudo no interior e no sul.

Incentivou a agricultura, atribuindo aos camponeses terras para cultivo, com regimes diferentes consoante as regiões do país – nomeadamente, Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes e Estremadura –, explorou os recursos mineiros e estimulou o comércio interno, desenvolvendo as feiras. Seguiu uma política de povoamento sustentada pelo desenvolvimento da economia de base e por uma organização administrativa de proximidade. Percorreu várias vezes o país de uma ponta a outra. Dir-se-ia estarmos perante um governante moderno; olhando bem, um governante melhor que os modernos.

Intuiu a importância política da língua, ordenando, em 1296, o uso exclusivo da língua portuguesa nos documentos oficiais. Com isto, devemos-lhe a língua que alimentou o nosso Estado-nação, que era um Estado-língua, e devemos-lhe também, por isso, o que hoje chamamos de Lusofonia.

Cuidou do conhecimento e do saber, e do aprofundamento da identidade portuguesa, ao fundar, em 1290, os Estudos Gerais, em Lisboa, que correspondem, hoje, à Universidade de Coimbra, uma das mais antigas universidades europeias.

Cuidou do mar, criando em 1312 uma organização permanente da Marinha Real, para cujo comando chamaria, poucos anos depois, a figura que ficou famosa: o Almirante Manuel Pessanha ou Emanuele Pesagno, genovês e experimentado. Não haveria Descobrimentos sem Marinha.

Contrato celebrado entre o rei  D. Dinis e Manuel Pessanha, de Génova, para este servir como seu almirante (ANTT).

E D. Dinis era um poeta, um trovador, um talento que expressou em mais de uma centena de cantigas medievais de todos os géneros (de amigo, de amor e de escárnio e maldizer), que fazem dele uma figura inapagável da nossa literatura, como expoente da arte trovadoresca, que eu estudei na História da Literatura Portuguesa, no liceu:

«- Ai flores, ai flores do verde pino,
se sabedes novas do meu amigo?
Ai Deus, e u é?»

Sobre “Ai Deus, e u é D. Dinis?” falar-nos-á o Dr. João Abel da Fonseca, na apresentação que preparou para nós e que, desde já, agradeço.

Viva El-Rei D. Dinis! Viva Portugal!

Dom Dinis (túmulo do rei no Mosteiro de S. Dinis e S. Bernardo de Odivelas)

* Discurso do Presidente da Direção da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, dr. José Ribeiro e Castro, na Homenagem a El-Rei Dom Dinis, no 7.º Centenário de sua morte, no Castelo de São Jorge, em Lisboa, no dia 7 de Janeiro de 2025